1 de nov. de 2011




Você trocou de aparelho de celular e não sabe como ativar e desativar
recursos? Você perdeu um relacionamento e tem preguiça só de pensar em
começar tudo de novo? O proprietário pediu o apartamento e tem
preguiça só de pensar em começar a procurar outro, tudo de novo?
Colocou botox e o efeito passou? Mudou de emprego, de setor, e vai
começar de novo? Tudo isso é Sísifo.
Camus: Se Sísifo não encontrar algum prazer em empurrar morro acima
aquele pedregulho, está perdido.


Afinal, o que é uma academia de musculação?

Os amigos, mais que a família, são meu esteio, minha base. É certo que
dou cambalhotas, tá até no filme, também coloco o pé no queixo, sou
uma senhora alongada.
Mas minha lombar doi doi doi aperta, repuxa, belisca, chamusca,
lateja, reflete, reverbera, uma dor que caminha, um prego que, qual
Cristo, me fura. Oscilo entre a raiva e o desespero. Sou capaz de
brigar porque tem fila no cartório. Sinto ânimo para isso. Não fiz um
escândalo porque estou deficiente e nem posso entrar na fila especial
porque minha cara é de queimada de praia, minha roupa é de coroa
jovial, mas no fundo dos meus olhos, os amigos percebem, e dizem: Hoje
você está com dor.
A maldição dos planos de saúde, que pagamos pagamos e quando
precisamos, demora demora. Se o plano de saúde fosse uma pessoa, eu
pegava na esquina. Mas é como a VIVO, que passa todas as minhas
ligações pro correio eletrônico e não pra mim, nunca pra mim, nem
quando estou ao lado do aparelho ligado.
Vivemos no mundo do telemarketing e (estou avisando) isso vai causar
doença. Atendimento eletrônico deveria ser proibido por lei e cláusula
pétrea. Guilhotina na Cinelândia! As empresas não querem mais pagar
funcionários, nos ligam em secretárias eletrônicas dique um disque
dois disque três e já estou pensando em outra coisa. O que que era o
disque um mesmo?
Multas milionárias para empresas que colocarem musiquinha no nosso
ouvido já tão castigado. Se for de mau gosto, bilionária, a multa.
Vivemos no mundo dos mortos-vivos. A polícia faz blitz e engarrafa
cinco quilômetros de estrada e ninguém sequer buzina. Quando buzino,
sou a doida. Doido são os que não se rebelam. Li, me contaram, ouvi na
TV ou sonhei: “Não me impressiona a maldade dos maus, mas o silêncio
dos bons”. Bons? E para que servem as pessoas que não se rebelam? Têm
utilidade na cadeira ecológica? Não creio.
Passeata pelo FIM dos Planos de Saúde que nos deixam doentes. Saúde de
povo é obrigação de governo. Meu amigo não tem plano de saúde, tem
aplicação e reserva para doença. Mesmo porque quando preciso de médico
bom, pago particular.
A lombar doi e não posso falar de Búzios me fingindo de saudável.
Seria cascata. Enganaria os meus quatro leitores. Causaria inveja nas
outras coroas que têm dor pra tudo quanto é lado. Enganando ser quem
não sou. Nem vem que já fui no ortopedista, no acupunturista, no
osteopata (que queria me hipnotizar), na fisiatra, nas homeopatas, nos
psiquiatras, na fisioterapeuta, no RPG, pilates, já fiz aplicações de
ozônio na minha coluna, já fiz tratamento de rejuvenescimento (não
fiquei boa e o médico morreu). Como é mesmo? Hidráulica, aquática?
Nada disso, hidroterapia. Chorava com as lágrimas afogadas na piscina.
Cheio de velhinhos com dor na minha turma.
Só gente MUITO velha. A conversa era: melhorou? Melhorou? Melhorou?
Nunca ninguém melhorava. Eu chorava porque achava que tinha chegado
meu fim.
Paguei o pacote e fui a duas sessões. Prefiro morrer em casa, em
Búzios, no jardim, apreciando as minhocas que não têm coluna
vertebral, a antiga espinha, invejando as cigarras que se esbaldam de
cantar e morrer sem se dar conta.
Nas sessões de hidroterapia, todos os velhinhos doem porque morrer dói
e acontece aos pouquinhos. A fisioterapeuta me colocava encostada
naquele buraquinho de onde sai água na piscina pra massagear minhas
costas. Por favor, isso faço na piscina do Fluminense ou da casa do
Carlos.
Como sofri, como envelheci naquela piscina pequena, morna, coberta, em
sol, apertada, cheia de idosos doídos, doloridos, desgastados, sem
assunto, sem humor.
Morreria por um comentário espirituoso em meu leito de morte.
O mundo é de quem foge. Fugir é uma arte, uma estratégia, um
meticuloso planejamento de vida. Agora mesmo, nesse momento, fujo da
dor, falando mal dela.
E sábado fugirei dessa cidade cheia de blitz, morros pacificados,
explorados, expostos hoje na mídia como um cartão de visitas. Por que
não pacificaram quando surgiu a primeira arminha de fogo, seus patetas
aproveitadores e safados?
Se lixam para quem mora lá e perde neto com bala perdida, os corruptos
ficam de olho na verba para os jogos olímpicos, para as copas do mundo
e por causa disso detesto natal, ano novo, copa do mundo, olimpíada,
futebol e tudo que institui ralo pra escorrer dinheiro público.
Obras, só se for de saneamento.
Vou pra rede, desligar celulares, desconectar computadores, troco
música por barulho de mata. Economizo em terapia, fico uma gracinha de
sandália havaiana e roupa de malha barata.
Um dia largo mão dessa cidade e enfio a mão na terra.
Já comecei a plantar umas mudinhas.




Os amigos, mais que a família, são meu esteio, minha base. É certo que
dou cambalhotas, tá até no filme, também coloco o pé no queixo, sou
uma senhora alongada.

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